Tarifas de 25% sobre aço e alumínio entram em vigor nos EUA; entenda os impactos para o Brasil
13/03/2025

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Especialistas ouvidos pelo g1 afirmam que o principal efeito será a diminuição das exportações para os norte-americanos. Cenário traz desafios, principalmente para o setor siderúrgico brasileiro.
A cobrança de tarifas de 25% sobre todas as importações de aço e alumínio nos Estados Unidos entrou em vigor nesta quarta-feira (12), um mês após assinatura de decreto pelo presidente Donald Trump.
A medida irá atingir em cheio o setor siderúrgico de grandes parceiros comerciais dos EUA, como o Canadá e o México. O Brasil, que ocupa o posto de segundo maior fornecedor de aço do país, também será impactado.
Por aqui, especialistas ouvidos pelo g1 afirmam que o principal efeito da medida será a diminuição das exportações para os norte-americanos. Além disso, o cenário traz desafios para o setor siderúrgico, que terá que redirecionar suas vendas ou, no longo prazo, diminuir a produção.
Entre as empresas que têm fábricas instaladas no Brasil, os efeitos devem ser diversos. De um lado, estão as companhias com maior atuação no mercado de exportação — e que podem sair prejudicadas, com queda no volume exportado.
Do outro, estão aquelas cujo peso das exportações é menor, tendo o impacto suavizado. Nesses casos, os desafios ficam com a mudança do mercado interno, diante do possível aumento da oferta de produtos aqui no país — o que tende a baixar preços e reduzir as margens das companhias. (Leia mais abaixo)
Os impactos para Brasil
O Brasil é, em volume, o segundo maior fornecedor de aço para os EUA, conforme dados do Departamento de Comércio norte-americano. Ao todo, foram 4,1 milhões de toneladas em exportações para o país em 2024.
Os números ficam atrás apenas do Canadá, responsável por 6 milhões de toneladas ao mercado norte-americano. Em terceiro lugar, vem o México, com o envio de 3,2 milhões de toneladas.
Ao todo, cerca de 25% do aço utilizado nas indústrias dos EUA é importado. No caso do alumínio, cujo principal exportador para o país também é o Canadá, essa parcela é de 50%.
José Luiz Pimenta, especialista em comércio internacional e diretor da BMJ Consultoria, explica que os EUA são grandes consumidores de aço e alumínio no cenário global — insumos importantes para a produção de automóveis, eletrodomésticos, eletrônicos, construção civil, entre outros setores.
"Brasil e Canadá serão os países mais afetados em termos de exportação. O que tende a ocorrer é um efeito de diminuição de importações [pelos EUA] desses países, sobretudo de aço, no curto e no médio prazo", diz.
Segundo Pimenta, o cenário irá exigir que o Brasil diversifique os destinos dos produtos, buscando mercados em outros países — tarefa difícil, já que a concorrência esbarra na China, uma grande exportadora. Outra alternativa seria tentar vender o excedente no próprio mercado nacional.
"Ainda precisamos entender como a indústria nacional vai se comportar e se conseguirá realmente absorver todo esse aço que outrora era exportado para os EUA", acrescenta.
Lia Valls, pesquisadora associada do FGV Ibre e professora da UERJ, acredita que, apesar da concorrência, parte das exportações podem até ser absorvidas pelo gigante asiático.
"A China prefere comprar produtos semifaturados [placas de aço e chapas de alumínio]. Ou seja, pode importar esses materiais para transformar em produto final", exemplifica. "Mas, em um primeiro momento, não está muito óbvio para onde as exportações brasileiras serão dirigidas."
O cenário incerto também decorre da possibilidade de Trump voltar atrás e decidir renegociar a aplicação dessas tarifas. Valls cita como exemplo o vaivém das taxas sobre o México e o Canadá, que entraram em vigor na semana passada e foram suspensas por mais um mês. (Leia mais abaixo)
Além da pressão externa, há o interesse de parte da indústria americana para que as taxas deixem de ser aplicadas. Não à toa, CEOs de grandes empresas estão pressionando Trump pelo fim da guerra comercial.
O interesse dos empresários vem do potencial das medidas de aumentar os custos de produção e os preços ao consumidor final — um desafio também para o Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA), que atua para conter a inflação no país.
O encarecimento dos produtos força o Fed a manter os juros norte-americanos elevados por mais tempo, o que gera um movimento de valorização do dólar em relação a moedas emergentes, como o real. Isso também pressiona a inflação no Brasil.
Trump utiliza as tarifas como forma de negociar pautas de interesse dos EUA — incluindo o aumento da segurança nas fronteiras — e de promover uma queda no déficit comercial com importantes parceiros. É também uma tentativa de incentivar a indústria nacional, por meio do aumento da produção e do consumo de itens locais.
Para o especialista em comércio exterior Jackson Campos, o cenário de queda nas exportações para os EUA também pode, em um segundo momento, prejudicar o mercado de trabalho na siderurgia brasileira.
"Com menos demanda, as fábricas podem ter que diminuir sua produção, o que pode levar a cortes de empregos. Muitas pessoas que trabalham diretamente na produção de aço e alumínio, além de setores como transporte e mineração, podem ser afetadas", diz.
Campos destaca que, outros setores, como o da construção civil e da indústria automobilística, também podem ser afetados no Brasil. "Se os preços subirem ou houver falta desses materiais, as obras e a produção de carros podem ficar mais caras ou mais lentas", diz.
"Sem uma solução negociada, o Brasil pode enfrentar dificuldades para manter sua competitividade no mercado global."
José Luiz Pimenta, da BMJ Consultoria, lembra que, apesar de o cenário não ter impacto significativo na balança comercial brasileira, trata-se de uma parcela importante na relação direta com os EUA: o aço representa, ao todo, quase 10% do total exportado pelo Brasil ao país em 2024.
Como a medida atinge as empresas
Os impactos das tarifas de Trump nas empresas do país foram avaliados em relatório do Itaú BBA. Segundo o banco, empresas exportadoras não listadas na bolsa de valores brasileira — que representam mais de 80% das vendas de aço para fora do país — serão as que mais devem sentir os efeitos negativos dessas medidas.
É o caso de multinacionais com operação no Brasil, como a ArcelorMittal e a Ternium, indica o Itaú. As companhias produzem placas de aço, que são compradas em grande escala pelos EUA e processadas para uso no mercado doméstico. Diante das taxas, os fluxos podem diminuir, afetando essas (e outras) empresas.
Por outro lado, o relatório aponta que siderúrgicas brasileiras como a Gerdau, Usiminas e CSN não seriam tão prejudicadas. O motivo é que as exportações são menos significativas para a operação dessas companhias, conforme explicou à BBC Daniel Sasson, analista do Itaú BBA para o setor de mineração e siderurgia.
Em nota publicada após o anúncio das tarifas por Trump, o Instituto Aço Brasil, que representa as siderúrgicas brasileiras, informou ter recebido "com surpresa" a decisão do governo dos EUA.
O instituto disse estar confiante "na abertura de diálogo entre os governos dos dois países, de forma a restabelecer o fluxo de produtos de aço para os EUA nas bases acordadas em 2018", ano em que foi estabelecida uma cota de exportação.
Donald Trump assinou em 10 de fevereiro o decreto que impõe tarifas de 25% sobre todas as importações de aço e alumínio do país. O início das cobranças ficou previsto para este dia 12 de março.
O objetivo de Trump ao taxar produtos de outros países é priorizar e incentivar a indústria local. Ele espera que, com custos de importação mais altos, haja um aumento na procura e na produção de insumos nacionais.
"A nossa nação precisa que aço e alumínio sejam produzidos nos EUA, não em terras estrangeiras", afirmou o republicano, ao assinar a ordem executiva que determinou a cobrança das tarifas.
Desde que assumiu seu segundo mandato, o republicano tem anunciado diversas taxas de importação. Trump prometeu, ainda durante a campanha eleitoral, tarifar uma série de produtos de outros países, em especial do Canadá e do México, seus principais parceiros comerciais.
São países com os quais os EUA têm déficit na balança comercial — ou seja, gastam mais com importações do que recebem com exportações.
Em janeiro, após assumir o cargo, o republicano impôs uma tarifa de 25%, mas adiou sua aplicação para março, enquanto negociava com os dois países.
Na última semana, porém, quando a cobrança começou, o republicano anunciou uma nova suspensão. Primeiro, isentou carros importados. Depois, retirou as cobranças de taxas sobre outros produtos incluídos no acordo comercial da América do Norte.
Em meio à suspensão de taxas de México e Canadá, Trump manteve as tarifas de 20% sobre produtos chineses. Já as cobranças sobre importações de aço e alumínio — as primeiras que afetam diretamente o Brasil —, entraram em vigor nesta quarta.
Veja a retrospectiva das tarifas no primeiro mandato do republicano:
- Em março de 2018, os EUA impuseram uma taxa de 25% sobre todas as importações de aço e de 10% sobre as de alumínio;
- O governo americano decidiu excluir Canadá e México, dois dos maiores fornecedores dos EUA, dessas tarifas e permitiu que outros países solicitassem inclusão em uma lista de exceção;
- O Brasil fez o pedido e foi aprovado. Os EUA criaram um esquema de cotas para as exportações brasileiras;
- O esquema de cotas permitia que produtos de aço ou alumínio semiacabados (usados como insumos para outras produções) fossem exportados até atingir um volume equivalente à média das exportações de 2015 a 2017;
- Para os produtos acabados, o limite de exportação era 30% menor que a média das exportações do mesmo período;
- Em agosto de 2018, as regras para a compra de aço foram flexibilizadas, permitindo que empresas americanas comprassem matéria-prima brasileira se comprovassem falta de oferta do produto nos EUA;
- Em dezembro de 2019, Trump acusou o Brasil de desvalorizar o real para estimular a compra de produtos brasileiros e prometeu reinstaurar as taxas de 25% e 10% sobre aço e alumínio, respectivamente;
- Dias depois, o então presidente Jair Bolsonaro afirmou que conversou com Trump e que os EUA desistiram de sobretaxar o aço e alumínio brasileiros;
- Em agosto de 2020, Trump restringiu ainda mais as cotas de exportação dos produtos brasileiros para os EUA, reduzindo-as em cerca de 80%;
- Nos últimos meses do governo Trump, em outubro de 2020, o presidente decidiu elevar as tarifas sobre as chapas de alumínio importadas do Brasil de 15% para 145%, alegando que as empresas brasileiras estavam vendendo produtos abaixo do custo para eliminar a concorrência americana;
- Em julho de 2022, já sob o governo de Joe Biden, o Ministério da Economia e o Ministério das Relações Exteriores do Brasil anunciaram que os EUA revogaram as medidas restritivas remanescentes da era Trump contra as exportações brasileiras.
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