Devolução de descontos do INSS deve ser de no máximo R$ 2 bi, estima Haddad

27/05/2025

Fonte: O globo Por Thaís Barcellos, Sérgio Roxo, Renata Agostini e Thiago Bronzatto — Brasília

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Aposentado e pensionista do INSS que foi descontado em abril terá devolução a partir desta segunda-feira

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, estima que o valor do ressarcimento dos descontos indevidos aos aposentados e pensionistas do INSS deve ser de até R$ 2 bilhões. Esse total de recursos representa cerca de um terço das deduções realizadas desde março de 2020, de R$ 5,9 bilhões, de acordo com dados divulgados pelo governo.

— Até pelo número de reclamantes, fizemos umas ponderações e chegamos a uma conta. Eu acredito que vai dar entre R$ 1 bilhão e R$ 2 bilhões — disse Haddad, em entrevista ao GLOBO.

O cálculo do ministro da Fazenda leva em conta o número de reclamações já realizadas pelos beneficiários no aplicativo Meu INSS e pelo telefone 135 após o escândalo de descontos indevidos vir à tona. No último dia 13, o governo notificou, por meio desses canais, os segurados que tiveram cobranças associativas indevidas entre março de 2020 e março de 2025 para que informassem se as deduções foram autorizadas ou não.

Esse movimento ocorreu após a Polícia Federal e a Controladoria-Geral da União (CGU) deflagrarem, no fim de abril, uma operação para apurar a suspeita de um esquema nacional de descontos irregulares. Segundo a investigação, integrantes de sindicatos e associações, além de empresários, teriam se beneficiado dos recursos desviados.

O desconto sindical no INSS é uma mensalidade associativa que pode ser cobrada de aposentados e pensionistas em troca de benefícios como assistência de saúde ou jurídica, mas depende de autorização prévia e expressa. As deduções mensais indevidas tinham valor baixo e, muitas vezes, passavam despercebidas pelos segurados, de acordo com a PF.

A partir da resposta dos segurados do INSS à notificação, o governo está entrando em contato com as associações para pedir documentos que comprovem a anuência de aposentados e pensionistas no prazo de 15 dias úteis. Caso não consigam demonstrar, têm mais 15 dias úteis para devolver os recursos à União.

2 milhões em 10 dias

 

Haddad disse que vai esperar a apuração do número final dos descontos indevidos, que deve ser divulgado em algumas semanas, para discutir com a área jurídica do governo e definir as fontes de recurso para o ressarcimento.

Até a sexta-feira, segundo os últimos dados disponibilizados pelo INSS, foram 2,057 milhões de consultas de aposentados e pensionistas que tiveram algum desconto no período considerado pelo governo, entre um total de 9 milhões de afetados.

Entre aqueles que acessaram os sistemas federais, 2,012 (97,8%) pediram reembolso — o restante, 46,2 mil, declarou ter autorizado a dedução. Esse balanço compreende os 10 primeiros dias de consulta dos descontos de entidades associativas na folha de aposentados e pensionistas.

O ministro da Fazenda evitou dizer se o bloqueio de bens dos sindicatos e associações envolvidos na fraude a pedido da Advocacia-Geral da União (AGU) será suficiente para o ressarcimento.

— Não temos ainda uma estimativa, mas são muitas centenas de milhões de reais bloqueados dessas associações. Ninguém será prejudicado, mas essa turma vai ter que pagar, inclusive com os seus bens pessoais — garantiu Haddad.

A AGU solicitou à Justiça o bloqueio de R$ 2,5 bilhões em bens de 12 entidades, mas há dúvidas se o dinheiro desviado será encontrado nas contas dos investigados e qual seria o prazo para devolver os recursos.

Diante dessas incertezas, Haddad evitou adiantar se uma eventual utilização de recursos orçamentários demandaria um remanejamento de gastos entre os ministérios ou implicariam na edição de um crédito extraordinário. O ministro da Fazenda, em busca de equilíbrio fiscal, anunciou na semana passada um congelamento de R$ 31,3 bilhões das contas públicas.

O crédito extraordinário é uma autorização legal para o governo gastar mais em situações de imprevisibilidade e urgência e seu custo não é considerado no limite de despesas do arcabouço fiscal.

— Assim que tivermos o valor, eu vou sentar com a AGU e vamos ver em que termos vai se dar o acordo (para o ressarcimento) — afirmou.

 

Devolução antecipada

 

Em outra frente, todos os aposentados e pensionistas do Instituto que sofreram algum desconto de mensalidade associativa na folha de pagamentos referente a abril terão os valores devolvidos a partir de hoje. Serão reembolsados, ao todo, R$ 292 milhões aos beneficiários.

No fim do mês passado, o INSS determinou a suspensão de todos os descontos desse tipo. Porém, como a folha de pagamentos referente àquele mês já estava fechada, os descontos ainda foram realizados nos pagamentos feitos entre 24 de abril e 8 de maio.

O INSS, no entanto, reteve esses valores e não repassou o montante às entidades associativas. Agora, a devolução será feita junto com o pagamento regular dos benefícios, de 26 de maio a 6 de junho. Para isso, o beneficiário não precisa tomar qualquer providência.

 

Acordo judicial

 

Segundo o ministro da Fazenda, ainda que o governo tenha decidido que vai agir proativamente, devolvendo os recursos dos segurados do INSS que manifestarem que foram lesados, o ressarcimento do período anterior a abril dependerá de um acordo judicial, para não “abrir um flanco” para contestações futuras.

Haddad disse que a AGU está se preparando para agir rapidamente assim que o número de descontos ilegais for consolidado.

O ministro também fez elogios ao ministro da CGU, Vinicius Carvalho, por ter envolvido rapidamente a Polícia Federal na investigação, ao contrário das autoridades que receberam a denúncia no governo Jair Bolsonaro.

— O ministro Vinícius fez um trabalho, na minha opinião, extraordinário. Extraordinário. Porque, em 2023, ele já envolveu a Polícia Federal no assunto. Com dados. Quem recebeu lá em 2019, 2020, a denúncia, não fez nada — disse Haddad. — Em 2023, ele já envolveu a Polícia Federal e aí não teve mais freio a investigação, a punição dos responsáveis e a recuperação do dinheiro.

 

 

A defesa de Haddad a Carvalho contrasta com a opinião de seu colega de Esplanada, o titular da Casa Civil, Rui Costa, que disse em entrevista ao GLOBO que a CGU falhou ao não fazer os alertas devidos assim que as primeiras apurações apareceram. Para Costa, o governo perdeu a chance de enfrentar as fraudes do INSS logo no início do terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva e evitar mais uma crise sobre a administração petista.

O esquema de descontos indevidos foi explorado nas redes pela oposição, que conseguiu assinaturas necessárias para abertura de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do INSS no Congresso. Na semana passada, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), afirmou que a instalação da CPI para apurar indícios de fraudes em aposentadorias e pensões ficará para junho.

Na avaliação do ministro da Fazenda, a esquerda não tem o mesmo domínio das redes da extrema direita, o que dificulta a comunicação do governo:

— Vai demorar muito tempo pra gente aprender a lidar e não podemos usar os mesmos instrumentos ou eles terão ganhado a disputa. Temos que aprender a lidar à nossa maneira, o que é mais difícil, porque lidar com a verdade é mais difícil.