Para entender a libido feminina
07/10/2024
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Não mais que 10% das mulheres têm disfunção do desejo sexual, afirma Carmita Abdo.
Na década de 1960, o casal norte-americano William Master (ginecologista) e Virginia Johnson (psicóloga) revolucionou o que se sabia sobre a sexualidade humana, mapeando as diferentes fases do ato sexual. Até o começo do século XXI, acreditava-se que homens e mulheres passavam linearmente por desejo, excitação, orgasmo e resolução – o estado após o clímax. No entanto, coube à pesquisadora canadense Rosemary Basson, professora do Programa de Medicina Sexual da University of British Columbia por 20 anos, esclarecer que esse é um modelo tipicamente masculino, o qual não descreve o caminho da libido feminina. O assunto foi recorrente no 25º. Congresso Mundial de Medicina Sexual (você pode conferir a coluna de quinta, sobre o uso abusivo da testosterona, nesse link) e tema da segunda parte da entrevista com a psiquiatra Carmita Abdo:
“O modelo Master e Johnson se aplica a cerca de 90% dos homens e a 10% das mulheres. Já o modelo circular da resposta sexual, proposto por Basson, se aplica, em média, a 90% das mulheres e a 10% dos homens. Antes dele, o entendimento era de que as mulheres que não tivessem desejo sexual espontâneo eram disfuncionais, o que abrangia praticamente 90% da população feminina em um relacionamento estável. Depois de Basson, estima-se que apenas 10% das mulheres tenham algum tipo de disfunção do desejo sexual que precise de tratamento”, explicou.
Apesar de o novo conceito existir há 20 anos, o segredo da libido feminino ainda se configura um mistério para muita gente. O modelo Basson não representa uma escalada em direção ao clímax, e sim um círculo com diferentes momentos. No início de um relacionamento, o desejo espontâneo brota quando se está na presença da parceria, e logo surge a vontade de fazer sexo. O estímulo leva a um estado de excitação e de mais desejo (chamado de responsivo), até a satisfação, acompanhada de intimidade emocional. Entretanto, as coisas não ocorrem, necessariamente, nessa ordem. Em determinado ponto do ato sexual, a mulher pode entrar num estado de “neutralidade”, como se “saísse” do jogo amoroso – por exemplo, porque pensou em alguma questão que tirou seu foco do ato – mas tendo a possibilidade de voltar a se excitar ao ser estimulada. A satisfação também não está atrelada ao orgasmo, ou seja, o sexo pode ser bom e alimentar a intimidade emocional. O resultado será a vontade de se engajar novamente numa relação com a pessoa.
“A grande contribuição de Basson foi mostrar que, se a mulher não tem mais o desejo espontâneo, ela pode iniciar a relação, sendo estimulada e se excitando com esse estímulo. O desejo pode ser posterior à excitação, ser responsivo, e a satisfação se dar com orgasmo ou mesmo que ela não atinja o orgasmo. Portanto, não é disfuncional ficar brevemente neutra durante o ato sexual, não é disfuncional iniciar com excitação e não desejo, não é disfuncional não ter orgasmo, desde que haja satisfação pela intimidade e contato físico-emocional. Somente a total falta de resposta ao estímulo, acompanhada de desconforto por isso, indica uma disfunção sexual”, ensina Abdo.
Nos relacionamentos longevos, o desejo espontâneo das mulheres tende a deixar de existir. O importante, diz a professora, é ter outros motivos pelos quais se está na relação na qual o sexo deixou de ser “acrobático” e o intervalo entre uma transa e outra aumentou.
“O período refratário, isto é, o tempo que transcorre entre uma relação e a vontade de ter outra, vai se estendendo. De acordo com os estudos que realizamos, aos 40 anos de idade, o sexo ocorre, em média, duas vezes por semana; aos 60, uma vez por semana; depois, de 15 em 15 dias. Não significa que o casal tenha alguma disfunção, apenas o sexo não tem mais o impacto de antes, mas há ganhos, em intimidade e no aconchego”, finaliza.
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