‘Desde os anos 80, a Odebrecht fazia pagamentos não declarados, diz Marcelo Odebrecht

17/12/2019

Depois de dois anos e meio preso, empreiteiro conta detalhes da briga no grupo, diz que departamento de propina virou folclore, mas que pagamentos por fora eram uma prática não só nas disputas eleitorais

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RIO — Preso por dois anos e cinco meses em Curitiba, condenado a mais de 30 anos de cadeia por corrupção, o engenheiro Marcelo Odebrecht, hoje com 51 anos, virou o símbolo da Operação Lava-Jato. Nunca antes um empresário tão poderoso havia sido alvo de uma ação tão dura. Em sua casa, em São Paulo, Odebrecht recebeu O GLOBO por duas ocasiões. Com limitações legais para falar sobre processos em andamento e em meio à disputa familiar sobre o futuro do grupo, ele contou como a empresa tinha a prática de fazer pagamentos não contabilizados — não apenas para campanhas eleitorais —, detalhou seu papel na “conta italiano”, exclusiva de recursos para o PT e o Instituto Lula. “Sempre fomos tolerantes com o caixa dois”, disse. “A crença de que os fins justificam os meios foi um grande pecado”.

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Quando a Lava-Jato explodiu, descobriu-se que o volume de recursos de caixa dois da Odebrecht era tamanho que havia um setor específico, o famoso Departamento de Operações Estruturadas.

Isso é folclore. Esse tal departamento de propina nunca existiu. A verdade é menos espetaculosa. Desde os anos 1980, bem antes de meu ingresso na empresa como estagiário, havia pessoas na Odebrecht que apoiavam os executivos na realização de pagamentos não contabilizados. Eram bônus não declarados para executivos, pagamentos em espécie a fornecedores, especialmente em zonas de conflito, investimentos em que não queríamos aparecer, caixa dois para campanhas, e eventualmente até propinas. Essas pessoas iam se sucedendo, e todas eram identificadas por algum programa dentro da Odebrecht para ocultar sua real função, sendo que as últimas pessoas se autodenominaram responsáveis por operações estruturadas.